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O futebol precisa de um Leicester campeão

Em boa verdade, se a Premier League for conquistada pelo Tottenham, o principal argumento deste texto mantêm-se intacto: o futebol precisa de um Leicester campeão. Qualquer Leicester. Com isto quero dizer que o futebol precisa de pequenos que derrubem os gigantes. O Leicester é somente uma encantadora metáfora com ares de sinédoque. Sem eles – os pequenos – o desporto-rei perde qualquer sentido de transcendência.

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O Leicester City recompensa os adeptos

O surpreendente líder da Premier League decidiu celebrar a inusitado primeiro lugar com um dos seus stakeholders mais importantes: os adeptos. Os foxies vão oferecer cerveja aos seus apoiantes, bem como vouchers para adquirir produtos oficiais do clube. A escolha de palavras da notícia do DN foi particularmente feliz, reflectindo as maiores qualidades destas iniciativas:

Os donos do clube, Vichai e Aiyawatt Srivaddhanaprabha, uniram-se ao patrocinador Singha Beer para garantir a distribuição de cerca de 30.000 cervejas no último jogo do ano em casa, marcado para terça-feira. (…) Mas o reconhecimento do Leicester aos fãs não fica por aí: no sábado, os adeptos que comprarem bilhete para a visita a Liverpool, no tradicional boxing day, vão receber um voucher para adquirir merchandising do clube nas lojas oficiais.

Se a liderança dos pupilos de Claudio Ranieri não era esperada, a boa comunicação por parte dos clubes ingleses – mesmo os pequenos – continua a ser referencial.

Mourinho: Tendência no despedimento e desafios vindouros

José Mourinho já não é treinador do Chelsea. O treinador português não resistiu a um primeiro terço de campeonato absolutamente desastroso. Se o Chelsea está mal, particularmente na Premier League, a reputação de Mourinho foi a principal vítima da péssima temporada que a formação inglesa está a realizar.

Como grande marca do futebol, a saída de Mourinho é hoje uma tendência nas redes sociais. A Ryanair, por exemplo, não perdeu tempo em apanhar uma onda alimentada no Twitter.

Agora vêm tempos particulamente desafiantes para um dos treinadores mais mediáticos do mundo. Depois de ter fracassado na gestão da comunicação de crise do Chelsea, os próximos passos de Mourinho serão cruciais para o fortalecimento ou enfraquecimento da sua marca. Este texto sobre a marca do Special One assume hoje ainda mais relevância.

Adeptos do Bayern relembram a importância de ter gente nos estádios

Já várias vezes se escreveu neste blogue sobre a importância de ter adeptos no estádio. Em primeiro lugar, porque só com eles o futebol se torna num extraordinário espectáculo televisivo. E a televisão tem sido fundamental para financiar uma indústria que se tornou gigantesca. Em segundo lugar, porque são os adeptos que os clubes “vendem” aos patrocinadores. Quem comunica através dos clubes procura notoriedade. Mas os adeptos não são todos iguais. Aqueles que revelam um maior empenho em relação aos clubes são mais valiosos: para além de atenção, representam também um comprometimento fortemente emocional. Resumidamente, quem patrocina procura beneficiar da relação adeptos/clube por justaposição.

Assim sendo, nunca é de mais destacar protestos originados por entraves a idas aos estádios. O mais recente foi protagonizado pelos simpatizantes do Bayern Munique, em pleno Emirates Stadium. O motivo? O preço dos bilhetes. É verdade que Inglaterra é um caso muito particular no que concerne aos custos de uma ida ao futebol: afinal, a Premier League é incrivelmente cara, mas tem sempre casas cheias. Para além disto, os adeptos alemães não estão habituados a pagar muito por uma entrada num recinto desportivo. Apesar de tudo isto, o protesto dos simpatizantes bávaros é mais um aviso útil a todos: sem gente nas bancadas, o valor do futebol é substancialmente menor.

Fonte: maisfutebol.iol.pt
Fonte: maisfutebol.iol.pt

Man City chama adeptos para discutir o emblema do clube

Este é mais um bom exemplo de comunicação dado por um clube inglês: o Manchester City convocou os seus adeptos para discutir um dos elementos centrais da sua identidade visual, o seu emblema. E esteve muito bem ao fazê-lo.

Quando o Paris Saint-Germain anunciou uma transformação do seu símbolo, tive a oportunidade de escrever sobre os riscos de mudanças deste género. Afinal, o emblema comporta uma tremenda afiliação. O símbolo de um clube é a expressão visual mais marcante da organização, é aquela que os atletas levam ao peito quando entram em campo. Por isso é tão estimado. O PSG optou pelo caminho mais seguro e tive a oportunidade de elogiar a escolha aqui. O Manchester City está a fazer algo ainda mais interessante.

A organização sedeada no Norte de Inglaterra parece compreender muito bem os terrenos em que se move. E não é de agora. O comunicado que anuncia a consulta refere que, “ao longo dos anos, muitos adeptos desenvolveram os seus próprios desenhos de como um novo emblema podia ser”. Com isto, o Manchester City mostra que, para além de estar atento ao que envolve o clube, reconhece um facto com crescente relevância: os públicos externos têm cada vez mais a possibilidade e a vontade de criar sobre as organizações de que mais gostam. E acabam por fazê-lo e divulgá-lo. O clube mostrou estar atento, evitando um lugar cimeiro e isolado numa qualquer Torre de Marfim.

Há ainda um outro dado a destacar: o clube preocupa-se em conhecer que património comum existe entre os seus adeptos, que elementos partilhados deve o símbolo reflectir. “Os citizens serão convidados a participar num questionário formal no qual serão inquiridos sobre as suas opiniões, incluindo que elementos são mais autênticos e que melhor reflectem o clube e a cidade de Manchester”, refere a organização. E se há coisa que deve preocupar quem trabalha a comunicação é a percepção do que existe em comum entre elementos de um público, sobretudo quando este é particularmente empenhado em relação à organização. Perceber o que é comum e autenticamente relevante é meio caminho andado para evitar crises e para saber o que potenciar.

Fonte da imagem de destaque: mcfc.co.uk

Ainda a confusão no Marselha: A reputação da Ligue 1

Já o escrevemos: o que se passa no Marselha tem contornos de anedota. Um dos grandes clubes de França perdeu a sua frente de ataque a troca de 15 milhões de euros. Isto porque apenas Payet foi transferido. Gignac e Ayew saíram a custo zero. E para onde se mudaram os jogadores: para dois médios clubes ingleses (West Ham, no caso de Payet, Swansea, no de Ayew) e para o… Tigres, do México.

Para além do amadorismo do clube do sul de França, é também preciso levar em consideração a própria reputação da Ligue 1. Ou seja, o topo do campeonato francês não consegue competir com a mediania do inglês. Para os jogadores parece ser mais prestigiante disputar a Premier League do que lutar por títulos do outro lado do Canal da Mancha. E acredito que esta situação se possa agravar com a hegemonia do Paris Saint-Germain, caso não seja promovida a competição interna. Nenhuma competição sai valorizada quando a luta já parece decidida logo à partida. E Inglaterra é mesmo o melhor exemplo de valorização pela competitividade e emoção.

O presidente da Federação Francesa de Futebol disse que a mudança de Payet foi desprestigiante para o futebol local. Em parte tem razão. Falta saber até que ponto os próprios responsáveis do futebol gaulês têm coragem para promover a competição justa entre equipas.

Fonte: maisfutebol.iol.pt
Fonte: maisfutebol.iol.pt

Steven Gerrard: A mudança difícil de uma extraordinária marca

A foto que antecede este texto sintetiza na perfeição o contexto em que Steven Gerrard disputou o seu último jogo em Anfield Road, enquanto futebolista do Liverpool. O internacional inglês fotografado de costas, em família, a protagonizar um gesto familiar. Aquele gesto e aquela companhia são muito mais significativos que um eventual rosto emocionado do jogador, enquadrado em grande plano. Mesmo sendo uma imagem estática, não nos é difícil imaginar o passo, a respiração, o ambiente. Tudo porque Gerrard é uma marca bem implementada e definida. Faz parte do nosso imaginário.

Para além disto, a fotografia apresenta um mito a protagonizar um ritual popularizado, daqueles que contêm um peso simbólico tremendo. Anfield é um palco histórico, repleto de tradições que lhe conferem uma marca única. A tradicional palmada na imagem que dá as boas-vindas ao estádio é muito mais do que um hábito, é a manifestação da especificidade do lugar. Como aquele não há nenhum outro e esse gesto relembra-nos isso mesmo. E quase todos o sonham repetir. Acresce ainda o facto de Anfield ser o espaço de Gerrard. Estádio e jogador são indissociáveis.

Enquanto marca, há um traço que define Gerrard: a permanência. Afinal, 17 anos na equipa principal do Liverpool e ainda mais alguns nas escolas de formação dos Reds representam constância. E, de facto, Gerrard resistiu a todos os assédios. Até aos de Mourinho, o melhor treinador do mundo na opinião do futebolista. E por que é que um atleta de eleição recusou todos os convites daquele que ele considera o melhor, logo, o mais habilitado para o colocar também no cimo da hierarquia do futebol? “Porque tem sempre mais significado quando ganhas para as tuas pessoas”, disse Gerrard à BBC Sport. A tentação de mudar existiu, claro. Mas no fim tudo se manteve.

A permanência de Gerrard não se manifesta apenas no caso raro (por isso ainda mais impactante) de ser um atleta de topo de um único clube, pelo menos até ao dia em que ingressar nos L. A. Galaxy. Também não basta referir a capacidade que teve em manter-se como jogador de eleição durante tanto tempo (é o melhor marcador dos Reds esta temporada, aos 34 anos, com 12 golos). De facto, a permanência revela-se em todos os aspectos, até nos mais pequenos detalhes, como deve acontecer com qualquer traço central de uma marca. Por exemplo, a imagem do jogador não mudou muito ao longo dos anos, como mostram estes cromos reunidos pela BBC. Houve sempre continuidade, nunca rupturas. Na imagem, no jogar, na carreira. Gerrard é uma marca que evolui na continuidade há mais de 17 anos.

Fonte: bbc.com/sport
Fonte: bbc.com/sport

Ao contrário do que se aplica a quase todos os outros futebolistas, não creio que serão as conquistas desportivas que definirão a memória de Steven Gerrard. Poucos começarão uma conversa sobre ele relembrando o triunfo na Liga dos Campeões, por exemplo. Ao invés, com o internacional inglês serão os aspectos intangíveis da sua marca que perdurarão: novamente, a sua lealdade, a sua liderança, a sua constância. Acredito, até, que a estranheza de nunca ter conquistado uma Premier League aumente ainda mais o mito. O facto de Gerrard nunca se ter sagrado campeão inglês confere algum drama à sua marca. Mais, o facto de estar directamente ligado a um lance fatídico que pode ter custado o título ao Liverpool no ano passado, frente ao Chelsea, contribui extraordinariamente para esse drama.

O ainda número 8 do Liverpool será um dos símbolos de um outro tempo, mas um símbolo capaz de resistir à passagem do tempo. A Major League Soccer beneficiará largamente da sua presença. Ainda assim, esta mudança para os EUA causa estranheza. Aquela que só incomoda nas marcas de que mais gostamos e que não queremos que mudem.

Fonte da imagem de destaque: facebook.com/premierleague

PS: A vontade que a Adidas mostrou em associar-se a esta despedida só mostra a grandiosidade da marca de Gerrard. Para além de um vídeo muito interessante, o pormenor mais relevante veio dentro das chuteiras do futebolista.

Fonte: metro.co.uk
Fonte: metro.co.uk

Futebol 365: Newcastle United e a falta de rumo de um clube com cofres cheios

Texto originalmente publicado a 10 de Maio de 2015, no site Futebol 365

Este texto resultou da colaboração semanal existente entre o Futebol 365 e este blogue. O objectivo desta parceria passa por pensar o futebol por um prisma pouco comum, ou seja, o da comunicação.

Na passada terça-feira, Fabricio Coloccini escreveu uma carta aberta aos adeptos do Newcastle United, actual 15.º classificado da Premier League. O experiente central argentino, capitão dos magpies, começou o texto com um primeiro parágrafo muito sincero. Essa entrada reforçou significativamente o peso simbólico do acto de comunicação: pela raridade do gesto, pela singularidade das palavras, pela precariedade do momento. De facto, a três jornadas do fim, a formação do Norte de Inglaterra está apenas dois pontos acima da linha de água.

“Normalmente não falo em público, mas hoje senti a necessidade de me dirigir a todos vocês por um conjunto de razões nas quais estão tão envolvidos como os jogadores, staff, directores e qualquer trabalhador do clube”, escreveu o atleta, no início da carta. Fabricio Coloccini pretendeu pedir o apoio dos adeptos para os três confrontos decisivos. Fê-lo devido à grande contestação que tem envolvido a equipa. Após oito derrotas consecutivas na Liga Inglesa, o fantasma da despromoção voltou a assombrar St. James Park.

Um dos grandes combustíveis da preocupação dos apoiantes tem sido os conflitos internos na organização. A título de exemplo, se o treinador acusa publicamente um jogador de ter sido expulso propositadamente, como é que os adeptos podem acreditar no compromisso do grupo de trabalho para com o clube? Assim sendo, o capitão assumiu (e bem) dar a cara pelo grupo e comunicou directamente com os adeptos. Como já mostrámos várias vezes no blogue, os momentos críticos tendem a gerar alguns bons momentos de comunicação. Só é pena que não tenham continuidade. E se o futebolista esteve bem, o mesmo não se pode dizer do clube: enquanto organização, o Newcastle não fez nada para chegar ao coração de quem o suporta.

Fonte: eurosport.com
Fonte: eurosport.com

Esta crise do Newcastle é uma crise de resultados, mas uma crise que tem na antecâmara razões mais profundas. A verdadeira crise é a de falta de rumo desportivo. No fundo, os magpies são um clube de futebol sem projecto de futebol. São uma organização gerida genericamente. Até apresentam resultados financeiros interessantes, mas parecem ignorar aquilo que está no centro do seu negócio, ou seja, o desporto. Em meados de Abril foi revelado que o clube lucrou mais de 18 milhões de libras no ano anterior. Para além disto, contava com uma almofada de 34 milhões de libras no banco. Quando estes dados vieram a público (a notícia do Guardian é do dia 15 desse mês), o clube ia na sua quinta derrota seguida. Para além disto, cerca de um mês antes, Mike Ashley, dono do Newcastle United e um dos homens mais ricos do Reino Unido, tinha admitido que devia ter investido mais em jogadores. Os adeptos, compreensivelmente, não tardaram a protestar contra a falta de ambição demostrada pela gestão da organização.

O Newcastle é um clube com um tamanho considerável, mas não se apresenta com objectivos consonantes com essa grandeza. Por exemplo, não se propõe abertamente atingir as competições europeias ou um lugar respeitável na Premier League. A grandeza construída não tem eco no quotidiano. A contratação de jogadores e treinadores também não indicia qualquer objectivo relevante. Há apenas sobressaltos e tentar fazer o melhor que o momento permitir. Actualmente, como tem sido hábito, o melhor a fazer é conseguir a permanência no primeiro escalão do futebol inglês.

Harry Kane e o ‘hype’ mediático

O avançado inglês dificilmente podia ter imaginado uma melhor estreia pela selecção dos três leões: ao fim de 90 segundos, Harry Kane coroou a estreia por Inglaterra com um golo. Naturalmente, este tipo de acontecimentos gera um enorme entusiasmo. Dos públicos, dos media e, quiçá, do próprio atleta. O cartoonista David Squires caricaturou com mestria este mesmo hype. A relativização de tudo isto será o melhor caminho que Harry Kane poderá dar a uma carreira ainda a começar. Gerir percepções e expectativas é cada vez mais importante para a sustentação de uma carreira (ou marca, etc.)

Fonte: guardian.com
Fonte: theguardian.com

As histórias que o futebol ainda dá a contar

Charlie Austin tem sido uma das boas surpresas da corrente Premier League. Apesar de jogar no modesto Queens Park Rangers, o ponta-de-lança inglês é um dos melhores marcadores do campeonato, com 15 golos. Para além destes bons números, Austin tem um percurso curioso: “em 2009, ainda assentava tijolos”, lembra o Maisfutebol.

Esta história de profissionalização tardia e de sucesso inesperado é importante para relembrar que o futebol tem de ser bem mais do que uma indústria de milhões gerida a régua e a esquadro. Como qualquer desporto (e marca), precisa de uma dimensão emocional. Precisa de ter um final aberto onde ainda seja possível surpreender e ser surpreendido. E a clássica afirmação de um underdog é dos ingredientes que os adeptos mais apreciam.

Fonte: maisfutebol.iol.pt
Fonte: maisfutebol.iol.pt