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Steven Gerrard: A mudança difícil de uma extraordinária marca

A foto que antecede este texto sintetiza na perfeição o contexto em que Steven Gerrard disputou o seu último jogo em Anfield Road, enquanto futebolista do Liverpool. O internacional inglês fotografado de costas, em família, a protagonizar um gesto familiar. Aquele gesto e aquela companhia são muito mais significativos que um eventual rosto emocionado do jogador, enquadrado em grande plano. Mesmo sendo uma imagem estática, não nos é difícil imaginar o passo, a respiração, o ambiente. Tudo porque Gerrard é uma marca bem implementada e definida. Faz parte do nosso imaginário.

Para além disto, a fotografia apresenta um mito a protagonizar um ritual popularizado, daqueles que contêm um peso simbólico tremendo. Anfield é um palco histórico, repleto de tradições que lhe conferem uma marca única. A tradicional palmada na imagem que dá as boas-vindas ao estádio é muito mais do que um hábito, é a manifestação da especificidade do lugar. Como aquele não há nenhum outro e esse gesto relembra-nos isso mesmo. E quase todos o sonham repetir. Acresce ainda o facto de Anfield ser o espaço de Gerrard. Estádio e jogador são indissociáveis.

Enquanto marca, há um traço que define Gerrard: a permanência. Afinal, 17 anos na equipa principal do Liverpool e ainda mais alguns nas escolas de formação dos Reds representam constância. E, de facto, Gerrard resistiu a todos os assédios. Até aos de Mourinho, o melhor treinador do mundo na opinião do futebolista. E por que é que um atleta de eleição recusou todos os convites daquele que ele considera o melhor, logo, o mais habilitado para o colocar também no cimo da hierarquia do futebol? “Porque tem sempre mais significado quando ganhas para as tuas pessoas”, disse Gerrard à BBC Sport. A tentação de mudar existiu, claro. Mas no fim tudo se manteve.

A permanência de Gerrard não se manifesta apenas no caso raro (por isso ainda mais impactante) de ser um atleta de topo de um único clube, pelo menos até ao dia em que ingressar nos L. A. Galaxy. Também não basta referir a capacidade que teve em manter-se como jogador de eleição durante tanto tempo (é o melhor marcador dos Reds esta temporada, aos 34 anos, com 12 golos). De facto, a permanência revela-se em todos os aspectos, até nos mais pequenos detalhes, como deve acontecer com qualquer traço central de uma marca. Por exemplo, a imagem do jogador não mudou muito ao longo dos anos, como mostram estes cromos reunidos pela BBC. Houve sempre continuidade, nunca rupturas. Na imagem, no jogar, na carreira. Gerrard é uma marca que evolui na continuidade há mais de 17 anos.

Fonte: bbc.com/sport
Fonte: bbc.com/sport

Ao contrário do que se aplica a quase todos os outros futebolistas, não creio que serão as conquistas desportivas que definirão a memória de Steven Gerrard. Poucos começarão uma conversa sobre ele relembrando o triunfo na Liga dos Campeões, por exemplo. Ao invés, com o internacional inglês serão os aspectos intangíveis da sua marca que perdurarão: novamente, a sua lealdade, a sua liderança, a sua constância. Acredito, até, que a estranheza de nunca ter conquistado uma Premier League aumente ainda mais o mito. O facto de Gerrard nunca se ter sagrado campeão inglês confere algum drama à sua marca. Mais, o facto de estar directamente ligado a um lance fatídico que pode ter custado o título ao Liverpool no ano passado, frente ao Chelsea, contribui extraordinariamente para esse drama.

O ainda número 8 do Liverpool será um dos símbolos de um outro tempo, mas um símbolo capaz de resistir à passagem do tempo. A Major League Soccer beneficiará largamente da sua presença. Ainda assim, esta mudança para os EUA causa estranheza. Aquela que só incomoda nas marcas de que mais gostamos e que não queremos que mudem.

Fonte da imagem de destaque: facebook.com/premierleague

PS: A vontade que a Adidas mostrou em associar-se a esta despedida só mostra a grandiosidade da marca de Gerrard. Para além de um vídeo muito interessante, o pormenor mais relevante veio dentro das chuteiras do futebolista.

Fonte: metro.co.uk
Fonte: metro.co.uk